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O comandante do Exército deveria ter batido em retirada, mas se rendeu

O general Tomás Paiva, comandante do Exército, enrolou-se na entrevista que deu aos jornalistas Sérgio Roxo, Geralda Doca e Thiago Bronzatto. Viu-se acuado por uma pergunta e, em lugar de bater em retirada estratégica, escolheu a rendição.

Os jornalistas lhe perguntaram o seguinte:

“Em abril de 2018, o então comandante do Exército general Villas Bôas publicou um post falando de impunidade às vésperas do julgamento do pedido de habeas corpus de Lula. O senhor, então chefe de gabinete do militar, elogiou a nota e concordou com a publicação. Hoje, como comandante do Exército no governo Lula, o senhor teria feito algo diferente?”

Qual teria sido a resposta esperável? Algo na linha do “prefiro não fazer comentários sobre as decisões e os gestos de comandantes anteriores”. Mas não. O general Tomás Paiva decidiu dar opinião:

“Teria (feito diferente). Eu acho que o comandante do Exército aqui tinha que ter sido mais veemente no assessoramento. Acho que nós erramos. Não vou julgar também o comandante anterior, a quem eu tenho toda a lealdade. Acho que é um erro coletivo. Não deveria ter sido publicado. Eu era chefe de gabinete e sou corresponsável por isso, apesar de ser um outro momento político. Agora, não houve pressão ao Supremo. O Supremo não se pressiona. O comandante do Exército é o comandante de ontem, hoje e sempre. Então, erramos.”

Antes de mais nada, o problema dessa resposta é que ela não poderia ser outra, a não ser a opinião nenhuma: como Lula é o chefe do comandante do Exército, Tomás Paiva não teria como afirmar que o general Eduardo Villas Bôas acertou ao mandar recado ao STF, naquele já longíquo 2018, alertando sobre o desastre que seria conceder habeas corpus a Lula na iminência da sua prisão.

Não existe subordinado que defenda cana para o seu chefe, concorda? Ainda mais se esse subordinado é um militar, cujo dever de hierarquia está acima de tudo.

Por que o general Tomás Paiva não bateu em retirada diante da bananosa? Ele deve ter achado que isso seria interpretado como aval ao famoso post do general Eduardo Villas Bôas — e decidiu se render.

Não estou afirmando que o general Tomás Paiva mentiu na sua resposta. Nem poderia. Mas é bastante inconvincente a resposta de que o post foi “erro coletivo”, de que hoje ele não teria feito o mesmo. Temos aí o segundo problema da resposta aos jornalistas.

É inconvincente porque o comandante do Exército deixa entrever a sua falta de convicção quando faz o reparo de que, há seis anos, o país atravessava “outro momento político”.

E que momento político era esse? O ápice da Lava Jato, com multidões nas ruas exigindo a prisão de Lula e indignada com as sucessivas tentativas do establishment de salvar o chefão petista no tapetão.

Ora, o general Villas Bôas — e também outros militares, como o próprio Tomás Paiva — enxergou claramente que, se o STF concedesse habeas corpus a Lula, o país mergulharia no caos.

O recado do então comandante do Exército foi para fora e também para dentro das Forças Armadas, porque a liberdade de Lula exaltaria os ânimos golpistas entre os militares. Esse aspecto vem sendo convenientemente esquecido, eu diria, já que não combina com o revisionismo histórico que está em andamento desde que a Lava Jato foi abatida a tiros.

A resposta do general Tomás Paiva contém uma verdade que julgo indiscutível: o Exército não pressionou o Supremo, pelo menos não indevidamente. Por meio do general Villas Bôas, avisou o tribunal de que a barra pesaria demais se fosse cometida a imprudência — e o erro — de beneficiar Lula com um habeas corpus. E o Supremo entendeu o recado, ainda bem.

Como eu já disse em outras paragens, Villas Bôas se comportou como soldado da democracia. O homem esteve à altura da sua circunstância. Se ele viria a se tornar golpista ou não, se a sua família aderiu ao bolsonarismo mais desmiolado e foi acampar na porta de quartel, isso não apaga o fato de que o seu post evitou que o país se incendiasse em 2018. Não foi um erro. Foi um acerto. A resposta do general Tomás Paiva é compreensível por Lula ser o seu chefe. Mas não é historicamente aceitável.


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