Decisão liminar vale até julgamento final da questão. Pedido foi feito pelo Ministério Público do Estado.
A Justiça Estadual determinou que o Instituto Previdênciáro do Rio Grande do Norte (Ipern) não faça saques dos recursos do Fundo Previdenciário (Funfirn) que estão aplicados. A decisão atende a um pedido feito pelo Ministério Público ainda no ano passado, para impedir que o Estado usasse cerca de R$ 300 milhões para pagamento de aposentados e pensionistas.
O temor é que Estado tivesse prejuízo por sacar o dinheiro antes do prazo estabelecido nos contratos de investimento com os bancos. Por isso, o Ministério Público pediu que o governo fosse proibido disso, a não ser que houvesse autorização legislativa por meio de Lei Complementar; que os recursos já estivessem disponíveis, com prazos das aplicações no mercado financeiro vencidos; ou se existisse dispensa formal de multas ou outras perdas, pelos bancos, por sacar o dinheiro antes do fim da aplicação.
No pedido inicial, o MP ressaltou que o governo tinha feito um acordo com outros poderes para sacar o recurso, mesmo sem autorização da Assembleia Legislativa. O Estado, porém, disse que esse saque não se concretizou. Em outro pedido, porém, a Promotoria do Patrimônio Público comprovou que o RN continua querendo usar o dinheiro. Tanto que no dia 18 de janeiro, durante convocação extraordinária, a Assembleia Legislativa aprovou o saque do Funfirn, a pedido do Executivo. O MP reiterou o pedido anterior.
A decisão da juíza da 1ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal, Patrícia Gondim Moreira Pereira, da última segunda-feira (29), atendeu a um pedido em forma de tutela antecipada, que vale até o julgamento final do mérito. Ela também determinou a notificação do presidente do Ipern. Em caso de desobediência, ele poderá responder por improbidade administrativa e descumprimento de ordem judicial.
“Podemos observar que a LCE 620/2018, recentemente publicada, que autoriza o saque ao FUNFIRN, como forma de empréstimo ao Estado do Rio Grande do Norte, importará inevitavelmente no desequilíbrio financeiro e atuarial, considerando que além dos valores a serem sacados para pagamento dos servidores inativos e dependentes, o que por si só, já o caracterizaria, ainda haverá o prejuízo do deságio acarretado pelo resgate das aplicações antes de seus respectivos vencimentos, que produziriam juros a longo prazo, o que faria decrescer o déficit atuarial e que fazia com que o Estado viesse cumprindo o mandamento legal previsto (…) de capitalizar os recursos do regime de previdência, e que agora, produzirão prejuízo ao Estado, sem que sequer seja informado o montante deste prejuízo”, disse.
Após a aprovação na Assembleia, o Tribunal de Contas do Estado também afirmou que o governo continua proibido de fazer o saque, por causa de uma decisão e ainda determinou multa em caso de descumprimento. O governo também não garantiu as outras duas exigências solicitadas pelo MP.
História do Funfirn
2003 – Como em todo o Brasil, a previdência estadual do Rio Grande do Norte funcionava em modelo de repartição simples. Isso significa que os servidores da ativa, que estão contribuindo com a previdência, pagam o salário daquele que já está aposentado. Porém, a partir deste ano, foi criado um fundo previdenciário para os novos servidores, em um modelo de capitalização. As contribuições dos servidores da ativa que entrassem a partir de 2003 iriam ser colocadas em aplicações financeiras para pagar a aposentadoria deles mesmos no futuro. O governo passou a arcar com o déficit do sistema anterior. O objetivo era acabar, em longo prazo, com o déficit previdenciário, previsto com a redução do número de servidores no estado e a aposentadoria dos antigos.
2014 – Já no final do seu mandato, a então governadora Rosalba Ciarlini (DEM) consegue aprovar na ALRN um projeto que unifica o fundo antigo (deficitário) com o novo fundo previdenciário (superavitário, com cerca de R$ 973 milhões). No mesmo dia em que a lei foi aprovada, os saques começaram. Somente em dezembro de 2014, foram sacados R$ 234.157.275,33.
Antes da aprovação da Justiça, o TJRN havia negado o pedido do governo para fazer saques no fundo. À época, o então presidente do Tribunal, desembargador Cláudio Santos, considerou a medida como “irresponsabilidade” dos gestores.
2015 – Ainda no primeiro ano de gestão, a equipe econômica do governador Robinson Faria (PSD) sacou mais R$ 589.157.572,32 para pagar aposentados e pensionistas, deixando a folha salarial em dia. Em dezembro o TCE decide que o saque é ilegal.
2016 – A Assembleia aprovou uma lei que estabeleceu um prazo de 20 anos, que começarão a ser contados em 2020, para o Estado devolver esses recursos sacados do Funfir. No texto da lei, porém, os deputados também autorizaram o Estado a sacar recursos em 2017, quando acabaria o período de aplicação deles no mercado financeiro.
Maio de 2017 – Ao fim do prazo da primeira aplicação, o estado sacou R$ 61.600.000,00.
Agosto de 2017 – Já em agosto, foram tirados mais R$ 28.000.000,00. Após esse saque, o TCE novamente determinou a devolução dos recursos e multa diária ao governador, de R$ 3 mil. Ao todo, desde 2014, foram sacados R$ 912.915.144,65.
Novembro de 2017 – Com dificuldade de pagar salários e atrasos nos repasses dos duodécimos, governo fecha acordo para tentar usar recursos que ainda estão aplicados. A multa para retirada fora do tempo é estimada em R$ 80 milhões. O valor total é de R$ 321.377.459,67 – soma das contribuições e o próprio retorno financeiro das aplicações. O Tribunal de Contas do Estado mantém o posicionamento contrário ao saque. A Promotoria de Patrimônio Público do MP também entra com ação cautelar para impedir o saque.
Janeiro de 2018 – Governo consegue aprovar nova lei na ALRN, que permite saque dos valores aplicados. Após representação de deputado da oposição, corpo técnico do Tribunal de Contas ressal que estado continua impedido de sacar recurso. Corte determina multa caso isso ocorra. O MP reforça o pedido à Justiça Estadual pela ilegalidade do saque e tem decisão liminar favorável.