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Interrogatório da filha faz de Temer um personagem ainda mais embaraçoso

A Polícia Federal marcou para esta quinta-feira o interrogatório de Maristela Temer, filha do presidente da República. Deseja-se saber de onde veio o dinheiro que bancou uma reforma na casa dela, em 2014. Os responsáveis pelo inquérito sobre o setor portuário suspeitam que a obra foi financiada com verba de propina recebida por Michel Temer. Ninguém disse ainda, talvez por comiseração. Mas a simples intimação de Maristela faz de Temer um personagem ainda mais embaraçoso.
O que mais provoca embaraço não é o lote de perguntas que os investigadores farão a Maristela, mas as respostas que seu pai ainda não foi capaz de prover. Na semana passada, Temer poderia ter saído da encrenca, tomando o caminho da transparência. Mas preferiu a bravata. O último líder político que enveredou por esse atalho foi Lula. Está na cadeia.
Irritado com a notícia de que a PF trabalha com a hipótese de lavagem de dinheiro por meio de reformas e aquisições de imóveis em nome de seus familiares, Temer subiu no caixote. Disse aos repórteres que se considera vítima de uma “perseguição criminosa disfarçada de investigação.” Realçou que seus advogados não têm acesso aos autos. E encomendou a apuração de vazamentos de dados sigilosos à imprensa.
Temer não se dispôs a responder a nenhuma pergunta. Simplesmente ralhou, bateu com a mão no púlpito três vezes, virou-se e foi embora. Absteve-se de conceder uma alentada entrevista coletiva porque sabia quais seriam as indagações dos repórteres. Um homem com a sua experiência já deveria ter aprendido: quem tem calos pode se meter em apertos.
Por que a reforma da casa de Maristela foi tocada por Maria Rita Fratezi, mulher do coronel ‘faz-tudo’ João Baptista Lima?, eis uma das perguntas que Temer não quis ouvir. Como explicar que, no trato com fornecedores e prestadores de serviço, a senhora Fratezi tenha revelado uma predileção pela forma mais primitiva de pagamento: o dinheiro vivo. Por que o coronel Lima se nega a depor há um ano? Ele não deveria ser a segunda pessoa mais interessa em mostrar a improcedência da acusação de que recebeu propinas em nome do amigo-presidente?
No roteiro que traçou para esquadrinhar a reforma, a PF acomodou o interrogatório de Maristela no meio de outros dois depoimentos. Nesta quarta, foi inquirido o arquiteto Carlos Roberto Pinto, contratado pela mulher do coronel Lima para trabalhar na obra da filha de Temer. Na sexta, os investigadores ouvirão Piero Cosulish, da empresa Ibiza Acabamentos. É um dos fornecedores que receberam em moeda sonante. Tudo muito constrangedor.
No ataque de nervos da semana passada, Temer chegou a dizer: ”Só um irresponsável e mal-intencionado ousaria tentar me incriminar, minha família, minha filha, meu filho de nove anos de idade, como lavadores de dinheiro. Dizer que lavei dinheiro numa casa alugada. Dizer que gastei R$ 2 milhões. Em que mundo estamos?”
Alguém deveria dar um GPS de presente a Michel Temer. Ele logo descobriria que estamos no planeta Terra, América do Sul, fundos, Brasil. Um pedaço do mundo onde a polícia invade os extratos bancários do presidente com autorização judicial. Um país comandado por um recordista em denúncias criminais. Uma nação que migrou da barbárie moral petista para a decadência ética peemedebista sem um estágio intermediário para chamar de “bons tempos”.
Num mundo assim, tão desqualificado, nada é tão embaraçoso que não possa piorar. Além da filha do presidente, encontra-se na alça de mira dos investigadores a primeira-dama Marcela Temer, a quem o primeiro-amigo José Yunes diz ter vendido uma casa. Antes de convocar os repórteres para divulgar novos pensamentos irrefletidos, o presidente talvez devesse passar na frente de um espelho.

Por Josias de Souza

 

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