As promessas de campanha do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva para o meio ambiente, apesar de bem recebidas pelo setor, deixaram entidades, especialistas, servidores do setor, organizações socioambientais e empresas engajadas com as pautas da sustentabilidade em compasso de espera. Diante da possibilidade de a área ambiental deixar de ser considerada um problema para o governo federal na futura gestão, ambientalistas andam apreensivos sobre como os temas de interesse do setor serão acomodados dentro e fora do Ministério do Meio Ambiente.
O assunto ganha especial relevância nesta semana em que Lula chega à Cúpula do Clima no Egito, a COP 27, que tem reunido as principais lideranças mundiais para tratar das metas climáticas e medidas pragmáticas que levam a avanços efetivos sobre o assunto.
A reportagem ouviu especialistas do setor, pessoas que participaram das diretrizes do governo e instituições que atuam na área ambiental. “É preciso que as políticas socioambientais sejam coerentes e coordenadas, ainda que as responsabilidades estejam distribuídas em diferentes instituições. O Ministério do Meio Ambiente tem um papel central nessa articulação. É preciso que o time esteja alinhado para que funcione”, diz Adriana Ramos, assessora de política Instituto Socioambiental (ISA).
A mesma preocupação é compartilhada pela Associação dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (Ascema). “O fim da gestão Bolsonaro vai permitir a retomada da pauta ambiental, mas é grande a preocupação sobre como isso será feito e como essas áreas vão conversar, como serão sobrepostas. Não adianta nada ter uma missão com uma visão em um ministério, se outra pensar de forma completamente oposta em uma área climática, por exemplo”, diz Tânia Maria de Souza, diretora-executiva da associação.
Marina Silva desponta, praticamente, como uma unanimidade para assumir a liderança das ações no governo Luiz Inácio Lula da Silva. Seu nome foi cotado para ocupar a Autoridade do Clima, uma nova instância a ser criada na gestão petista e que tem previsão de ficar acima dos demais ministérios e de se posicionar ao lado da Casa Civil da Presidência, atuando de forma “transversal” entre todos os ministérios.
“A questão da mudança climática é e deve ser a essência, daqui para frente, da política de qualquer País na questão ambiental. Isso envolve, certamente, a preservação de recursos naturais, o uso sustentável desses recursos, a proteção àqueles que protegem o meio ambiente, quanto aos seus direitos”, diz pesquisador sênior do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) Paulo Moutinho. “Portanto, qualquer articulação que um governo faça, terá que encarar uma política integrada, onde a questão climática é chave para o tema econômico e social, e deve ser tratado dessa forma. Não há país que vai se desenvolver econômica e socialmente, se não cuidar já da questão climática e ambiental de forma harmônica.”
A diretora-executiva na Rede Nacional Pró Unidades de Conservação, Angela Kuczach, defende abertamente a nomeação de Marina Silva, mas também chama a atenção para abrir espaço a novos nomes no setor. “Temos a chance de apostar em pessoas que dominam a área do meio ambiente e que consigam dialogar com os setores menos radicais do agro e da mineração, por exemplo. Há expectativa é de que o governo esteja aberto para essas pessoas”, diz.
Na prática, para além de especulações, o cenário está em aberto. Debaixo do cargo de um ministro, há funções de extrema relevância, como a secretaria-executiva, número dois de qualquer pasta, além de diretorias e coordenações de áreas determinadas. Na cúpula do governo, o esforço é tratar do tema com discrição.
Na bolsa de apostas do setor ambiental estão cotados para chefiar o Ministério do Meio Ambiente o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e deputados como Alessandro Molon (PSB-RJ), Nilton Tatto (PT-SP) e Rodrigo Agostinho (PSB-SP). O nome da ex-presidente do Ibama, Suely Araújo, também é ventilado como opção dentro da formação do governo. Empresários e gente do setor financeiro têm mencionado, ainda, o nome da ex-ministra do Meio Ambiente, Isabela Teixeira, que comandou a pasta durante a gestão da ex-presidente Dilma Rousseff.
Os ambientalistas acreditam que haverá retomada de ações no setor com a reabertura de fundos internacionais de apoio à fiscalizações contra o desmatamento e as queimadas na Amazônia, além da recomposição de órgãos que foram depauperados, como o Ibama, o Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) e a Fundação Nacional do Índio (Funai).
ONGs também defendem que outros ministérios do governo estejam abertos para tratar os temas ambientais mais caros, como os compromissos para mitigar o aquecimento global. “É necessário que tenhamos especialistas climáticos trabalhando em questões ambientais em todos os ministérios: junto ao MMA, mas também junto ao ministério de Minas e Energia para a promoção de uma transição energética justa, ou das Relações Exteriores em negociações internacionais, da Economia, do Planejamento”, diz Marcelo Laterman, porta-voz de Clima e Justiça do Greenpeace Brasil.