Os executivos e ex-executivos da empreiteira Odebrecht afirmaram, em depoimentos de delação premiada à força-tarefa da Operação Lava Jato, que a empresa repassou R$ 37 milhões em doações irregulares, o chamado caixa 2, para a campanha presidencial de 2014.
De acordo com levantamento feito pela Agência Brasil a partir dos depoimentos de cinco delatores, as campanhas eleitorais presidenciais do PT, do PSDB e do PSC, em 2014, tiveram R$ 24 milhões, R$ 7 milhões e R$ 6 milhões, respectivamente, em repasses ilícitos. Parte das doações irregulares era feita em espécie e repassada em mochilas durante encontros entre mediadores da empresa e dos partidos.
Os valores foram detalhados pelos ex-executivos da companhia, que tiveram os depoimentos homologados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no início deste ano. Na semana passada, com base nas delações premiadas, o ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no STF, determinou a abertura de inquéritos para investigar os políticos com foro privilegiado na Corte citados nos depoimentos.
Responsável pelas maiores negociações, o ex-presidente da empresa, Marcelo Odebrecht, conta que, após acertar os valores com partidos e candidatos que receberiam apoio, as doações eram operacionalizadas entre seus subordinados e representantes dos candidatos. De acordo com ele, como havia um limite para doação oficial, a Odebrecht sempre recorria ao caixa 2 para concretizar os repasses acertados previamente.
O ex-diretor de Relações Institucionais da empreiteira, Alexandrino Alencar, descreveu como foi feito o acerto para a campanha à reeleição de Dilma Rousseff (PT). Ele disse que combinou com o então coordenador financeiro da campanha, Edinho Silva, o repasse de R$ 35 milhões a serem distribuídos igualmente a cinco partidos para que apoiassem o PT. O objetivo era o “aumento do tempo de horário eleitoral na televisão” que, conforme Alexandrino, teve incremento de um terço após os pagamentos feitos ao PROS, PRB, PCdoB, PDT e PP.
Do valor acertado, os delatores indicam que R$ 24 milhões foram de fato repassados. O ex-diretor da Odebrecht em Salvador, Hilberto Mascarenhas Silva, conta ter recebido, em julho de 2014, um e-mail de Marcelo Odebrecht autorizando o pagamento, a ser “debitado na conta pós-Itália”, que era uma espécie de crédito que o governo federal e o PT tinham com a construtora, e que ia sendo abatido conforme os pedidos. Documentos fornecidos pelos delatores ao Ministério Público Federal (MPF) indicam que R$ 5 milhões foram repassados ao PROS, R$ 2 milhões ao PDT, R$ 5 milhões ao PRB e R$ 7 milhões ao PCdoB, além de R$ 5 milhões ao marqueteiro da campanha do PT, João Santana, que está preso.
De modo mais genérico, os delatores indicam que outros pagamentos foram feitos a João Santana no exterior, mas não são detalhados os valores nem os períodos. Em um dos depoimentos, Marcelo Odebrecht detalha também os repasses feitos de forma oficial. “Para a campanha de 2014, teve a doação oficial, se não me engano de R$ 5 milhões no primeiro turno e de R$ 2 milhões no segundo turno, que saiu dessa conta. Teve uma doação que a gente fez de R$ 5 milhões para o Comitê do PT, que depois foi para a campanha dela, já combinado com o Edinho. Houve também doações para João Santana, os pagamentos por fora”, disse o ex-presidente da companhia.
Os repasses para campanha de Aécio Neves à Presidência também envolveram valores direcionados a outros partidos, além do PSDB. Os delatores afirmaram que Marcelo Odebrecht havia combinado com o tucano uma doação de R$ 15 milhões, que acabou não ocorrendo porque, de acordo com ex-presidente da Odebrecht Infraestrutura, Benedicto Júnior, “eles não queriam receber o pagamento lá fora”. O ex-executivo da empresa descreve que R$ 3 milhões foram pagos em várias parcelas de R$ 250 mil, entre maio e setembro de 2014; e que outros R$ 3 milhões, em três parcelas de R$ 1 milhão, também no mês de setembro.
Então vice-presidente de Relações Institucionais da Odebrecht, Cláudio Melo Filho, disse que outro R$ 1 milhão foi repassado ao DEM, partido que apoiou o PSDB nas eleições de 2014. De acordo com Marcelo Odebrecht, outros valores chegaram a ser repassados ainda na época da pré-campanha.
“A partir daí, dentro da nossa lógica empresarial, de que campanha presidencial era comigo, eu comecei a definir os valores de pagamento. Eram R$ 500 mil por mês por dez meses pré-campanha e que foram operacionalizados antes da abertura do comitê dele. Esse foi o valor que eu acertei com o Aécio. Depois fizemos uma doação oficial, de R$ 5 milhões, mais ou menos o mesmo valor que a gente deu para a Dilma”, disse Marcelo Odebrecht aos investigadores.
Já a campanha de Pastor Everaldo (PSC) teve R$ 6 milhões em caixa 2, conforme os delatores. Nesse caso, o valor combinado era menor, de R$ 1 milhão, mas o ex-presidente da Odebrecht Ambiental, Fernando Reis, conta que mais repasses foram solicitados pelo candidato.
Segundo o delator, o acerto envolvia também um pedido para que o candidato do PSC escolhesse Aécio Neves para fazer perguntas durante os debates presidenciais veiculados pela TV. “O procedimento insistente ocorreu várias vezes e terminamos pagando em torno de R$ 6 milhões em entregas no período eleitoral de 2014, tendo como propósito levar para os debates presidenciais a discussão da privatização. De fato, pude notar que o Pastor defendeu com veemência o discurso pró-privado, chegando a dizer que iria privatizar tudo o que fosse possível”, disse Reis em um de seus depoimentos.