Caso a ampliação da Comissão de Inquérito Parlamentar (CPI) sobre Covid-19 se confirme, senadores do colegiado deverão se debruçar sobre pelo menos 76 operações deflagradas pela Polícia Federal — com 147 prisões e 1.160 mandados de busca e apreensão — desde o início da pandemia que miram governadores e prefeitos. As investigações avançaram sobre o governo de dez estados e tratam sobre fraudes em licitações, superfaturamento de contratos e desvios de verbas. Há ainda apurações que atingem o governo federal, incluindo o presidente Jair Bolsonaro e o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, em função da recomendação do uso de remédios sem eficácia no Amazonas e no Pará
Segundo a PF, os valores de contratos suspeitos de irregularidades nos estados totalizam mais de R$ 2,1 bilhões. Desde abril do ano passado, houve operações contra integrantes de pelo menos dez governos estaduais — dois governadores, Wilson Witzel (PSC), do Rio, e Carlos Moisés (PSL), de Santa Catarina, estão afastados respondendo a processos de impeachment por fraudes em gastos emergenciais na Saúde. Amapá, Amazonas, Distrito Federal, Pará, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Rondônia e Roraima são outros estados que tiveram governadores ou secretários na mira da PF.
Witzel foi alvo da Operação Placebo, em maio de 2020, que investigava irregularidades na contratação da organização social (OS) Iabas para gerir sete hospitais de campanha do governo do Rio. Os contratos somam R$ 836 milhões. Em agosto, em nova operação da PF, a Tris In Idem, Witzel foi afastado do cargo por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O Ministério Público Federal (MPF) havia chegado a pedir a prisão do governador.
Em Santa Catarina, Moisés foi alvo da PF em setembro na Operação Pleumon, que realizou buscas e apreensões para investigar um gasto de R$ 33 milhões na compra de respiradores. A suposta fraude também levou à abertura de processo de impeachment, que afastou Moisés do cargo, em março, pela segunda vez.
No Pará, a Operação Para Bellum, em junho, também mirou compra de respiradores pelo governo do estado. A investigação, que teve entre seus alvos o governador Helder Barbalho (MDB), apura um contrato de R$ 50,4 milhões por respiradores que apresentaram defeitos. Barbalho voltou a ser alvo da PF em setembro, na Operação S.O.S., destinada a apurar contratos de R$ 1,2 bilhão firmados para gerenciar hospitais de campanha.
A primeira operação da PF contra governos estaduais, deflagrada em abril, investiga um dano de R$ 4,9 milhões ao erário na compra de materiais hospitalares por parte do governo do Amapá, chefiado por Waldez Goez (PDT). No Amazonas, em junho, a Operação Sangria mirou gastos de R$ 2,9 milhões do governo Wilson Lima (PSC) com uma adega por uma suposta compra de respiradores.
Prefeituras de capitais também entraram na mira. Em agosto passado, a Operação Nudus tratou de possíveis irregularidades na compra de aventais descartáveis pela prefeitura de São Paulo, no total de R$ 11 milhões. Em diferentes operações, a PF cumpriu buscas e apreensões contra pessoas ligadas às prefeituras de Recife (PE) e de Fortaleza (CE) por suspeitas envolvendo gastos em hospitais de campanha. Outras capitais, como São Luís (MA), Macapá (AP) e Rio Branco (AC) também foram alvos de operações. De acordo com a PF, já foram cumpridas ao todo 12 prisões preventivas e 135 prisões temporárias.
Além da CPI do Senado, o governo federal já está na mira de pedidos preliminares de investigação pela gestão da pandemia. Em fevereiro, o procurador-geral da República, Augusto Aras, abriu uma investigação preliminar sobre a atuação de Bolsonaro e do então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, na crise provocada pela Covid-19 no Amazonas e no Pará. O objetivo é apurar se houve prevaricação ao recomendar remédios sem eficácia para tratamento da Covid-19. Em outra frente, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) protocolou no mês passado uma representação na PGR em que pede o oferecimento de denúncia ao STF para que Bolsonaro seja processado criminalmente por sua atuação na pandemia. A OAB cita declarações de Bolsonaro sobre a hidroxicloroquina, o uso de recursos públicos para a compra do medicamento e a morosidade na compra de vacinas.
A advogada Fernanda Tórtima diz que a CPI do Senado poderá requisitar documentos e provas relacionados a inquéritos já em andamento.
— O Supremo Tribunal Federal (STF), inclusive, já admitiu que as CPIs se utilizem de documentos oriundos de inquérito policial sigiloso.
Com informações de O Globo