O economista João Maia volta a exercer um mandato na Câmara dos Deputados a partir de primeiro de fevereiro, quando toma posse com os demais parlamentares eleitos e reeleitos. Ele vai exercer o terceiro mandato de deputado federal – os dois primeiros foram entre 2007 e 2015 — e retorna ao Congresso Nacional determinado a defender uma reestruturação do Estado brasileiro.
“As estruturas estatais ficaram tão grandes, burocráticas e ineficientes que e como se a população vivesse para servir ao Estado e não o Estado, a população”, afirma.
Ele também alerta que os políticos do Rio Grande do Norte precisam mudar a estratégia na busca de uma retomada dos investimentos da Petrobras no território potiguar.
Para ele, no lugar de pedir a estatal que recupere o ritmo que já teve no Estado, o caminho é convencer de que o melhor é passar a operação para a iniciativa privada.
“A privatização da operação da Petrobras no Estado pode gerar uma onda de investimento tão forte que resolveria a questão da geração de emprego, de renda e ainda o problema das finanças do Estado”, afirma João Maia.
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Como está vendo os rumos que a equipe econômica tenta dar ao país neste primeiro mês de governo Jair Bolsonaro?
No Brasil, há um problema principal e outros que, em parte, tem autonomia e, em parte, são derivados desse. Desde 2013, temos recessão ou depressão econômica. Entre 2014 e 2016 o PIB brasileiro caiu quase 8%. Isso, em tempos de paz, é inédito. Como a população cresce quase 0,5% ao ano, significa que o mercado brasileiro ficou 10% mais pobre. Então, é preciso que o país retome o caminho do crescimento econômico. Sem crescimento, a discussão da redistribuição fica vazia. Não estou dizendo que é preciso crescer para distribuir renda. Estou dizendo que não se distribui sem crescimento.
Quais as dificuldades que temos hoje?
O Estado brasileiro, ao longo do tempo, passou por uma inversão. É como se o povo brasileiro e, claro, o do Rio Grande do Norte, trabalhasse para servir ao Estado. As estruturas estatais ficaram tão grandes, burocráticas e ineficientes que é como se a população vivesse para servir ao Estado e não o Estado, à população. Isso tem uma esperteza, porque as elites — sejam empresariais ou dos servidores públicos de todos os poderes — defendem os próprios interesses, como se fossem da população. “Nem um direito a menos”, afirmam. Mas é como se a população pudesse não ter direito à educação de qualidade, à saúde adequada, à segurança publica eficiente.
Então, existe uma organização do Estado que gasta recursos públicos e gera incerteza. A União ainda se financia colocando título da dívida pública no mercado, mas estados e municípios comprometem pagamentos de fornecedores, funcionários e os serviços básicos à população. O país, portanto, tem esse problema maior: um Estado que vive em função dele mesmo, como se fosse uma família imperial.
Como essa situação poderia ser enfrentada?
Nós precisamos equilibrar e racionalizar os gastos do Estado. Isso é precondição para retomar o caminho do crescimento. Então, sem reforma da Previdência, desburocratizaçâo, redução da estrutura estatal, que só falta regular a cor da calça e da camisa… Para que as forças vivas do Brasil, os pequenos, médios e grandes empreendedores façam o país andar e gerar emprego, renda e imposto, é preciso mudar essa situação. Se um “marciano” chegasse ao Brasil e conhecesse o Código de Defesa do Consumidor, os estatutos da Criança e do Adolescente e do Idoso, e tantas estruturas estatais que existem para fiscalizar a aplicação destas normas, acharia que estamos no país mais desenvolvido do mundo, porque essas leis são de uma sofisticação… Mas isso não tem relação com a vida real. A equipe econômica do governo tem consciência de que precisa simplificar, reorganizar as despesas do Estado e passar credibilidade para que os investidores internacionais e nacionais exerçam a vocação ao crescimento econômico acelerado. E. dentro deste processo, corrigir as desigualdades sociais e na distribuição de renda. Digo que é fácil e agradável distribuir ovos. Mas o Brasil está precisando de incentivo para que se crie galinha e tenha, com isso, mais e mais ovos para distribuir. Chegamos a uma situação na qual esta política de engessar o investimento produtivo, em nome de uma política distributiva, até bem intencionada, colapsou. Há governos, como sabemos, sem condições de pagar o servidor, imagine cuidar de educação, da saúde e da segurança.
Pelos primeiros movimentos do governo Bolsonaro, ele demonstra ter condições de fazer essas mudanças?
A intenção é essa… A equipe econômica tem muita autonomia e bons quadros. Fez o diagnóstico de que não temos outro caminho que não seja retomar o crescimento e, para isso, é preciso passar segurança jurídica ao investidor. A insegurança jurídica faz com que o investidor tenha medo de caminhar, porque não sabe o que vai encontrar e qual instância vai impedir o processo de instalação ou ampliação de uma nova empresa. É necessário reduzir essa insegurança e o Estado passar a ser um facilitador do empreendedorismo. Isso não é tirar direito. Não podemos é ter um empreendedor com medo de investir. O Estado precisa ser parceiro de quem gera emprego, renda, paga imposto. No Rio Grande do Norte, para gerar novos empregos dependemos da iniciativa privada. Ou o Poder Público se mostra parceiro ou não haverá emprego, renda e impostos. O Estado precisa cumprir suas atribuições, entre as quais garantir a oferta de uma educação que assegure condições para que as pessoas possam competir em igualdade de condição. A equipe econômica percebeu que é preciso deixar o Estado no essencial. O Banco do Brasil é essencial? Sim, afinal se trata de um grande financiador do agronegócio, tem capilaridade, está em muitas cidades do interior. Mas precisa ter uma agência de turismo como a BBTur e uma corretora de valores? Isso é estratégico para o país? A Petrobras é outro exemplo. Trata-se de uma empresa estratégica, claro. Mas se meteu em tudo o que foi aventura. Então, a nova equipe econômica tem a percepção da necessidade de reduzir o Estado ao que e estratégico.
O senhor acha que esse caso Fabrício Queiroz pode provocar instabilidade política?
Afirmar que não é relevante… Como disse o general Mourão, ele tem sobrenome e isso significa implicações. É preciso ver os desdobramentos, mas sei que existe um sentimento nacional de que está na hora do Brasil andar, dar certo. Mas digo que é desconfortável, desgastante [o caso Fabrício Queiroz para o governo]. Não sei mensurar se isso afeta algum ponto da agenda econômica. Eu me interesso por três pontos: A econômica, para destravar o país; a segurança pública, porque não e possível a gente viver em um país onde praticamente grande parte dos estados é controlada pelo crime organizado; e pela reorganização estatal para acabar com a “judicialização da política e também com a politizaçâo do Judiciário”.
Até onde devem ir as privatizações?
A Petrobras não deve ser privatizada. Os acessórios da Petrobras, sim. A Petrobras foi uma grande aliada do desenvolvimento do Rio Grande do Norte, hoje é um entrave. Por quê? Terceiriza quase toda sua atividade aqui e não é o desenvolvimento e a produção no Rio Grande do Norte que está no foco. Se passa para uma empresa que tenha o Estado como foco, vamos gerar milhares de empregos, royalties e impostos para que o RN se mova. Sempre que as pessoas afirmam que é preciso ir a Petrobras, digo: “Você não entendeu”. A Petrobras fez dezenas de acordos nos Estados Unidos. E olhe para nós, aqui. Faz um acordo para pagar bilhões lá e a ação sobe no outro dia, porque assumiu um compromisso de governança segundo o qual não pode fazer investimento com taxa de retorno abaixo de determinado patamar. Está assinado, acordado. Então, o Rio Grande do Norte deixa de ser prioridade. Se pega uma empresa chinesa, alemã, francesa ou brasileira, que transforme o Estado no foco, podemos ter aqui 8 a 10 bilhões de dólares em investimentos em 4 ou 5 anos, o que tiraria o Rio Grande do Norte de qualquer crise. A Petrobras é essencial. Mas precisa ser dona do gasoduto e de refinarias? Está hoje concentrada no pré-sal e isso é importante, estratégico.
Então quando a classe política e lideranças empresariais do Rio Grande do Norte vão à Petrobras e pedem investimentos direto estão com uma estratégica equivocada?
Eu tenho convicção do que estou falando. Se a classe política arejar a cabeça… Às vezes é difícil mudar uma mentalidade. Eu já fui nestas reuniões para defender a retomada dos investimentos da Petrobras. Mas se a classe política tiver clareza do que é a Petrobras hoje, vai dizer: “Por favor, passe para mãos competentes a operação no Rio Grande do Norte e Ceará, porque temos petróleo que pode gerar uma grande atividade económica”. Os poços em terra no Estado, onde a Petrobras não investe mais, não e o foco dela. Eu até diria que a economia do Rio Grande do Norte não caiu totalmente, porque tem a energia eólica, que não compensa totalmente, mas tem alguma atividade. O Rio Grande do Norte é muito privilegiado em termos de potencial para crescimento.