“Ou o governo se ajeita agora ou a madeira vai cantar”, diz em off – solicitando sigilo de fonte – um deputado que faz parte da oposição ao governo de Robinson Faria (PSD) na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte (ALRN). O aviso é simples: a gestão deverá começar a enfrentar dificuldades na tramitação de projetos de seu interesse já a partir do segundo semestre de 2017. Até o ano passado, o governo conseguiu aprovar praticamente todas as matérias que enviou para o Legislativo sem grande esforço.
De acordo com parlamentares, resultado de um trabalho coletivo para tentar resolver situações críticas do estado, como a escassez de água provocada por uma seca de meia década, crise financeira e insegurança pública. Essa conjuntura política ainda tem certo prazo de validade, porém, conforme 2018 se aproxima, os acirramentos políticos voltam à tona e podem prejudicar a atuação do governo.
É possível que uma resistência maior já possa ser sentida na votação dos projetos entregues nesta semana ao Legislativo, como a limitação de gastos e, em especial, o aumento da contribuição previdenciária dos servidores estaduais.
Para alguns, a gestão de Faria já deve ter ligado o sinal amarelo no início do ano legislativo, quando, de forma unânime, os deputados derrubaram 42 vetos realizados pelo Executivo, integral ou parcialmente, em projetos de lei aprovados na Casa. Enquanto colegas governistas consideraram algo normal – e afirmaram que o Executivo não se manifestou sobre o assunto – o deputado Getúlio Rêgo (DEM) considerou que o governo precisa dar atenção ao Legislativo e em especial à sua própria base.
“Eu achei muito estranho. Eu já fui líder de governo e quando a gente perdia um veto era uma depressão. Havia um constrangimento muito grande. A derrota nem sempre é assimilável. Ali foi uma verdadeira tsunami, uma coisa devastadora que nunca tinha sido registrada na história, pelo menos nos meus 34 anos de Assembleia”, apontou.
Rêgo foi líder inclusive do governo de Rosalba Ciarlini, antecessora de Robinson. Vinte e três dos vetos derrubados eram da gestão da ex-governadora, atual prefeita de Mossoró. “Não houve nenhum sinal de reação, foi tudo muito passível, tolerante”, acrescentou. Questionado se a derrubada dos vetos era interessante ao Executivo, o deputado considerou que a estratégia seria um tiro no pé. “Uma autoagressão”, pontuou.
Atualmente o Executivo conta com uma situação confortável. Dos 24 parlamentares, sete são da base declarada do governo, formada pelo próprio partido do governador, o PSD, além do Pross e do PCdoB. Mas o governo não conta apenas com esse grupo. Encerrada a janela partidária aberta em março de 2016, o PSDB, que não tinha nenhum representante no Legislativo estadual, passou a ser a maior bancada da casa, com cinco deputados.
Embora tenham declarado independência política, os membros do partido apoiam o governo nas votações e tramitações de projetos. Ezequiel e Gustavo Fernandes são apontados como aliados do governador. José Dias também é amigo pessoal de Robinson e aliado antigo, embora tenha se distanciado no início do mandato por causa da aproximação de Faria com o PT – casamento desfeito meses após a eleição.
Embora tenha metade da Casa, o governo conseguiu unanimidade em vários projetos. Vivaldo Costa (Pross) atribui as vitórias ao trabalho do líder do governo, Dison Lisboa (PSD) e especialmente ao presidente da AL, Ezequiel Ferreira de Souza, que é do PSDB. “Na minha visão, esse apoio do deputado Ezequiel Ferreira tem sido determinante. O principal fator das vitórias que o governo vem tendo na casa. Não sei se esse fenômeno vai continuar, se o deputado Ezequiel vai estar disposto a ir até o final apoiando. Não sei. Mas acho que o presidente é o fator mais importante”, conclui.
Vivaldo ainda considera que o PMDB, que é o maior opositor ao governo, também segue as diretrizes do presidente do Legislativo. De acordo com seus pares, Nelter Queiroz, líder da legenda até poucos dias atrás, flutua entre críticas e elogios ao governo. Já Hermano Morais, recentemente escolhido como novo líder do PMDB, garante que o partido continua sendo oposição e, no momento certo, vai começar a trabalhar numa candidatura de oposição ao governador. Ele considera que o partido tem feito uma oposição responsável, sem sectarismo.
“Todos os projetos que sejam encaminhados pelo governo e que entendamos necessários, bons, iniciativas interessantes para a população, estamos dispostos a votar e apoiar. Naqueles que são danosos ao povo, votamos contra. Vamos agir assim até o fim do mandato”, asseverou.
Hermano considera a derrubada dos vetos como um sinal de insatisfação do plenário como um todo com o governo. “Foi a demonstração de insatisfação do Poder Legislativo com a falta de atenção do Executivo, em alguns momentos. Considerando que o Poder Legislativo, como um todo, tem colaborado para que o governo possa vencer as dificuldades. Apesar dessa postura, o que se vê é um certo descuido do governo nessa relação, que poderia ser melhor”, considerou.
Instado a esclarecer a declaração, o deputado apontou que o governo não cumpriu as emendas parlamentares, que em tese são impositivas, ou seja, obrigatórias no orçamento. “Na prática, uma falta de respeito ao parlamento, que é autônomo, independente e que vem fazendo sua parte buscando uma boa relação com os outros poderes”, concluiu.
Base
Os deputados da base consideram que ainda é cedo para falar sobre eleições e especulações políticas. Jacó Jácome (PSD), que é presidente municipal do partido governista em Natal, avaliou que a derrubada dos vetos não foi resultado de insatisfação do legislativo. “Foi apenas convicção de que aqueles projetos eram importantes para o estado. O nosso líder deixa muito a vontade, convence, conversa, dialoga e não impõe. Por não impor, abriu a oportunidade de as pessoas votarem contra”, argumentou.
Vivaldo, já citado na reportagem, disse que o governo não trabalhou contra a derrubada. “Eu tenho votado as matérias em consonância com o pensamento do governo. Eu votaria pela permanência de voto se tivesse vindo uma recomendação do governador através do seu líder. Mas não houve nenhum trabalho político e a bancada não foi orientada para a permanência dos vetos”, salientou. “Eu sou da bancada do governo e pretendo ficar até o final. Minhas bases são todas ligadas a Robinson e pretendo permanecer. Não recebi nenhuma orientação e votei também com o pensamento da maioria”, concluiu.